03 novembro 2008

Segundo Domingo


Meu dia ontem foi bastante especial.
Estou a cada dia gostando mais da capital dos riograndenses. O estilo das ruas, as pessoas, o clima agradável. Algo que me deixa bastante feliz é que aqui voltei a sentir aquela sensação de novidade, da possibilidade de encontrar o novo ao dobrar uma curva, ao sair detrás das árvores e ver um parque repleto de surpresas a serem descobertas. Não tinha essa sensação desde que voltei da Europa, e senti-la outra vez é muito bom.
Ontem fui ao Parque da Redenção (oficialmente chama-se Faroupilha, mas aqui eles chamam Redenção) e notei tudo muito light. Sem os doidos que conheci na semana anterior... Fiquei sentado, escrevi alguns versos no meu caderno, somei-lhe alguma prosa, ri bastante da cantada da menina lésbica sobre a menina hetero. " Oi. Você é hetero?" - "Eh... Sou." - "Ah. Desculpa então." - "Quer dizer, depende. É você que quer saber?" - "Não. É a minha amiga. Aquela ali." - "Loirinha bonitinha sua amiga. Se ela quiser conversar..." e foram dar um passeio enquanto a amiga lesbica ficou sentada no banco ao lado do meu. Puxei assunto, não sobre sua lesbiandade, mas sobre o que poderia eu fazer na cidade num dia de Domingo. Foi que acabei descobrindo sobre o show que acontecia na Usina do Gasometro. Show, ar livre, um mar de pessoas... é pra la que eu vou. Fui caminhando pra melhor conhecer o caminho. Chegando lá descobri que aqui existe um sindicato para os guardadores de automoveis, no Rio chamados flanelinhas, me soou engraçado. Se arranham seu carro podemos reclamar no sindicato?
Entrei no mar humano. Tocava uma banda da qual não me lembro nem nome, nem música. Tentei até identificar na multidão algum dos doidos conhecidos na semana anterior, mas não tive grande sucesso ou interesse de encontra-los. Um grupo, dreads na cabeça; "Oi irmão. Sou de fora, posso chegar?" - "Chega ai." O nome do cara era Teimoso, figura fácil de lembrar. Cabeça feita. "Valeu teimoso. Vou navegar." E fui andando meu caminho sem trilha certa, costurando as almas e dentro do meu proprio mundo.
De repente alguém falou comigo. "Ei, você conhece Bevar Cristiania?" Que maravilha, uma alma para ser salva.
(Voltemos algumas horas antes. Estava eu dentro do meu cubículo, recém saido do banho. Olhei o tempo, pouca ameaça de chuva seria apesar do céu cheio de nuvens. "Vou de chinelo e manga curta." Coloquei minha camisa do São Jorge, mas olhei na gaveta aquele vermelho. "Não, vou colocar essa camisa. Hoje vou conhecer alguem especial por causa dela.")
Me uni ao grupo. "Esse é fulano, essa é ciclona e essa é metadona..." Não lembro um nome sequer. Até tentei conversar por algum tempo, mas com tantos decibéis fica mais complicado ter um dialogo justo. "Eh, vou dar uma volta." Voltei ao mar.
Sentei numa área mais afastada pra poder observar de longe a multidão. Se meus olhos fossem uma maquina fotografica, que fotos ja teria feito na minha vida... passou um tempo. "Posso sentar aqui, brother?" - "Eu prefiro ficar sozinho. Mas como o parque é público." Cara muito estranho, fedido, magro, nervoso e muito suspeito. Sentou bem perto de mim. Tensei, esperando o bote. Ele olhou pra um lado, pra outro, olhou pra trás como procurando alguma coisa, virou pra mim e quando ia puxar alguma coisa debaixo do casaco eu pulei pra longe olhando fixo o infeliz. O cara tentou levantar atrás de mim mas escurregou e caiu. Patético. Minha vontade foi enxer o imbecil de porrada, pra descarregar toda a testosterona que esta acumulada no meu corpo. (Ah, ficar sem sexo é dicifil). Mas pra que iria eu semear violência quando o que quero é paz?
Segui meu caminho... Quando a tarde foi chegando ao seu fim o céu abriu lugar ao Sol. Pude então ver o famoso pôr do Sol de Porto Alegre. A Sol apareceu para se pôr, fiz até uns versos sobre o momento. "Curti" um pouco o show do Afroreagge, que chato, já passou minha fase "favela". Continuei navegando e um grupo começava uma fogueira. "É pra ali que eu vou." Chegando lá vi uma menina que segurava umas claves tão bonitas e azuis, "Posso brincar com suas claves?" "Você sabe?" "Um pouco." Fiquei durante um bom tempo dentro do meu mundo brincando com as claves, a fogueira já estava forte então. Otimo final de dia, maravilhoso inicio de noite. Já me sentia então menos anti-social que antes, e nesse grupo acabei me enturmando um pouco mais. Todos universitarios, inclusive um deles eu tinha conhecido na semana anterior, ele que lembrou de mim. Conversamos sobre muitas coisas, principalmente sobre o Rio de Janeiro. É bom saber que as pessoas aqui gostam tanto da minha terra. "Vamos pra um show que tá acontecendo lá na cidade baixa? é gratis." Adoro essa frase curta e direta: "é gratis". Fui. 11º festival de musica de Porto Alegre. Fiquei pouco tempo lá. Preferi estar embaixo de uma marquise ao lado da sorveteria blablando sobre já nem me lembro o que. Nada como filosofar sobre tudo e nada sentado na rua. Deveriam ensinar esses costumes nas escolas. Deram onze da noite, e decidi que o melhor seria voltar ao meu cubículo. Meu segundo Domingo foi bastante completo.


Isso.

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